Page 35 - Ensino Superior n.º 61
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          divirta estudantes entediados e sem motiva-  gostamos de pensar que temos tido muito a
          ção, e um pesquisador profundo (e por vezes   sorte de muitas coautorias e parcerias muito
          até sisudo) que descubra as pólvoras do fu-  fecundas… Mas une fois n’est pas coutume…
          turo, a competição nacional e internacional,   À  febre  de  produção  em  massa  se  junta
          por vezes luta pela sobrevivência de progra-  a  avaliação  pela  popularidade  junto  dos  es-
          mas  de  pós-graduação  e  mesmo  de  gradua-  tudantes.  Há  felizmente  muitos  professores
          ção, para satisfazer metas abstratas determi-  e  muitas  instituições  que  moderam  bastan-
          nadas nos gabinetes, leva a que a pesquisa e   te a importância destas sondagens de popu-
          a publicação deixem de ser amadurecido fru-  laridade. Apesar de não deixarem de as levar
          to de uma exigência de curiosidade científi-  a cabo (a pressão do educativamente corre-
          ca, inquietação do espírito e fruto de pacien-  to é enorme). Porque disso (de correção edu-
          te labor de seguir pistas, para uma produção   cativa e de popularidade) se trata. Avaliações
          em massa de estudos que mais poluem que   meramente facultativas e que  dão trabalho
          adiantam. E que são normalmente avaliados   a  preencher levam  a
          por critérios formalíssimos, que igualmente   que  apenas estudan-
          não colocam em questão o essencial: a origi-  tes  muito motivados   “Poucos sabem que
          nalidade, o contributo para o progresso dos   para dizer bem ou mal
          estudos, etc..                       acabem  por  “votar”...   os docentes são
            Apesar de  a  quantidade  aumentar  ex-  Isso falseia tudo.  a profissão mais
          ponenciamente  para  números  demenciais   Perguntar a um es-
          (já mesmo a quantidade de revistas e livros   tudante do primei-  massacrada com
          é enorme, embora os livros sejam absurda-  ro semestre se o  pro-  avaliações de todo o
          mente preteridos pelas revistas), a qualidade   fessor sabe a matéria,
          tem de decair muito, desde logo pelo volume,   quando o aluno acaba   tipo. As formais e as
          pelo ritmo, pela confusão e dispersão. Nun-  de entrar no curso não   informais.”
          ca foram tão necessários críticos agudos, re-  é evidentemente uma
          senhas de obras realmente esclarecedoras e   pergunta  sobre isso,
          mesmo impiedosas…                    mas sobre a seguran-
            Escrever artigos científicos passa não só a   ça com que o docente dá as aulas, a mise-en-s-
          ser uma atividade banalizada, como um item   cènes que usa, etc.. No limite, tudo se confun-
          essencial da avaliação pessoal dos docentes e   de com a simpatia e empatia de que é capaz.
          das instituições. E não se descobre a pólvora   Quando  estas  avaliações  sejam  levadas
          todos os anos... A mania da escrita leva mes-  realmente a sério, o problema pode tornar-se
          mo os desportistas, artistas plásticos e musi-  muito grave… Um dia se irá concluir que os
          cistas  a tornarem-se teóricos das suas artes...   melhores docentes só anos depois são avalia-
          Não parece bem.                      dos com justiça (pelos antigos alunos, que en-
            Como  o  docente  tem  que  produzir  mui-  tretanto adquiriram distanciamento e matu-
          to e para mais em grupo, salvo casos felizes   ridade). E se em certos casos há docentes com
          de boas equipes naturais (que dão ótimos re-  muito valor que conseguem ser populares, tal
          sultados) em muitas situações (salvo labora-  não é dom de todos. Há casos clássicos e até
          tórios e afins) a autoria plural pode ser um   anedóticos.
          jogo de soma zero. Bem ou mal, a verdade é   Tivemos aulas de licenciatura em três es-
          que há séculos que artistas, literatos e juris-  colas  superiores  de  cursos  diferentes.  Tive-
          tas (pelo menos) são individualistas, e os que   mos  muitas  dezenas  de  professores,  em  vá-
          não o são muitas vezes não possuem muita   rios países. Em todos os graus existentes…
          coisa nova a dizer. Donde se chega a um im-
          passe: os que seriam mais criativos sentem-  Concluímos (é um paradoxo interessante)
          -se inibidos pelas coautorias artificiais, e os   que  nem todos os professores  podem (nem
          que se sentem à vontade nelas não têm nada   devem) ser muito bons. Os professores medío-
          de novo a dizer… Há exceções. Pessoalmente   cres também têm o seu papel: descansam-nos
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